Por Pe Júlio
Ferreira e Thales Emmanuel.*
Diz-se raiz do problema aquela que é causa primeira, sem a
qual o problema deixa de existir.
Nosso problema começa há quinhentos e poucos anos, quando se
iniciou a imposição, pela violência, a povos inteiros de um modelo de sociedade
em que o direito de uns poucos tinha que se alastrar a todos os cantos na mesma
medida em que o dever da maioria só poderia ser entoado na nota única da
obediência.
As regras do jogo sempre foram claras:ou amém ou
chibata. A maneira como o problema foi se desenvolvendo também não mudou muito
de um lugar para outro: promessas de prosperidade futura, cooptação de
lideranças, manobras que colocavam comunidades e povos contra eles mesmos,
ameaças, migalhas compensatórias que não compensavam, cadeias, assassinatos,
criminalização de toda forma de resistência etc.
No território invadido, cercas foram inauguradas com pomposas
festas para poucos convidados. Ao povo, sobrou um direito bondosamente
concedido: aplaudir de longe os novos Descobrimentos.
Como nenhum Cabralse
mantém sem concentrar para si o poder das armas, um Estado logo foi estruturado
para dar vazão e razão às civilizadas
ideias da classe dominante. Governos de fora, depois locais, imperiais ou
republicanos, fascistas ou populistas, revezaram-se sucessivamente no disputado
cargo de marionete do sistema.
Os anos passaram e a velha caravela, cheia das boas intenções,
foi rebatizada com suntuoso nome: neodesenvolvimentismo, uma espécie de neoliberalismo
caridoso.
São barragens, eólicas, carciniculturas, hotéis-resorts, remoções de comunidades para
dar passagem a grandes eventos, extermínio da juventude pobre, redução de
direitos trabalhistas, transgênicos, agronegócios... É tanta da sigla se
empenhando no prosseguimento de 1500que
o povo tem ido insistente e massivamente às ruas protestar pela descolonização.
A resistência se mantém viva!
O problema social brasileiro tem profunda raiz, é verdade,
mas nada que o sopro do vento de um povo que vai às ruas e que luta não consiga
arrancar.
O poder popular é a chave para se resolver a complexa equação
em que o Estado se instrumentaliza, a partir dos interesses de uns poucos, para
oprimir a maioria da população.
Que o próprio povo o coloque no banco dos réus e saia deste
tribunal sentenciado a cumprir uma missão de vida em que os projetos dos
grandes possam se restringir unicamente a uma história passada e cada vez mais
remota.
* Pe Júlio Ferreira é missionário Redentorista e Thales Emmanuel é
militante do Movimento dos/as Trabalhadores/as Rurais Sem Terra (MST). Ambos
são membros da Organização Popular (OPA).