Por Thales Emmanuel*
Outro dia, na
fila do pão, escutei um sujeito que vestia vermelho, consternadamente, falar
pra outro:
– Se Aécio
tivesse sido eleito... Se tivéssemos votado nele, ao invés de Dilma... Ao menos
não teria havido golpe.
Semana
passada, um blog previa:
“Temer durará,
no máximo, até fevereiro ou março do próximo ano. Há uma trama da cúpula
burguesa para substituí-lo por uma junta parlamentar. Em seu programa, até
Faustão fez críticas ao governo.”
Vai que isso
acontece e ele retorne em 2018, indo para um segundo turno com Bolsonaro?!
“Putz! O pior
dos cenários.”, pensei.
Mas logo me
lembrei que uma rejeição generalizada das ruas poderia surgir daí: “Ufa! Finalmente,
a greve geral.”
“Intervenção
militar para pôr fim ao caos social!”. Não é assim que a repressão justifica o
esmagamento das forças populares? Em 64 foi por conta da “ameaça comunista”.
Sem o componente ideológico, como dizem, que outro “perigo” se apresentaria
agora?
“Terrorismo!!”.
Merda! O que estava ruim pode ficar ainda pior.
Lá vem os
Marines numa chuva de paraquedas! O navio bélico USS Lassen atraca na costa baiana.
Na invasão, militares explicam para o povo que agem em defesa da democracia, contra
a ameaça do Estado Islâmico. Argumentam com seus projéteis calibre 45. Nosso
Capitão América estupra e tortura. Tem nou-ral nesse ramo. Os destroços de Afeganistão
e Iraque confirmam as intenções da missão da classe dominante estadunidense.
Não sei ao
certo quando tudo começou. Na fila do pão, perguntei ao rapaz de vermelho por
que votara em Dilma:
– Porque era a
menos ruim.
– E por que agora
preferiria a vitória de Aécio Neves? – Insisti.
– Aécio seria
menos ruim que o golpe. Menos ruim que Temer.
Abandono do
trabalho de base pelo tempo de TV do programa eleitoral. Socialismos acomodados à lógica burguesa de fazer política. Aceitação crítica da
barbárie. Política como escolha do menos ruim. Do menos ruim ao menos ruim, o
escorregar contínuo em direção ao mais pior.
Paguei o pão e
enlacei a sacola. Quando já saía do mercadinho, um senhor, aparentemente de
muita idade, segurou-me pelo antebraço com sua mão calejada. Com um jeito
caracteristicamente camponês, falou-me olhando firme nos olhos:
– Não é porque
estamos num tempo ruim que devemos esquecer o que é bom.
*Thales
Emmanuel é militante do Movimento dos/as Trabalhadores/as Rurais Sem Terra (MST)
e da Organização Popular (OPA).