Por Thales Emmanuel*
No início de novembro deste ano, após o Terceiro Encontro
Mundial dos Movimentos Populares, no Vaticano, o papa Francisco tornou a
assemelhar cristãos e comunistas:
“São os comunistas os que pensam como os cristãos.
Cristo falou de uma sociedade onde os pobres, os frágeis e os excluídos sejam
os que decidam. Não os demagogos, mas o povo, os pobres, os que têm fé em Deus
ou não, mas são eles a quem temos que ajudar a obter a igualdade e a liberdade.”
Logo depois do primeiro encontro, realizado em Roma,
2014, Bergoglio já havia dito algo parecido. No segundo, ocorrido em 2015, em
Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia, o papa teceu críticas incisivas contra a
sociedade capitalista: "Queremos uma mudança, uma mudança real, uma
mudança de estruturas. Esse sistema é insuportável."
Ao longo da história, a aproximação entre Jesus e
Marx (principal referência da luta comunista moderna) foi sempre marginalizada
e muito perseguida. Esse fato pode ser explicado pelo
desconhecimento, por preconceitos; mas, sobretudo, pela manipulação promovida para atender a interesses
econômicos e políticos dominantes, que sempre lucraram com a separação.
Jesus se doou pela construção de um mundo em que
todos tivessem vida em plenitude. Para tanto, defendeu a partilha radical do
pão e uma forma de governo que, como fermento na massa, servisse à participação
popular. Na Europa do século 19, Marx se envolveu na luta por uma sociedade sem
exploradores e explorados. Suas teses revelaram ao mundo a origem das
desigualdades sociais. Em suas respectivas épocas, ambos marcharam na contramão
dos poderes estabelecidos.
Padre Ernesto Cardenal, participante da Revolução
Nicaraguense, conhecida pelo massivo engajamento cristão, fala que Jesus e Marx
são diferentes, mas não incompatíveis. Conta ainda:
“Declarei, muitas vezes, que sou marxista por Cristo
e seu Evangelho. Que não fui levado ao marxismo pela leitura de Marx, mas pela
leitura do Evangelho. O Evangelho de Jesus Cristo me fez marxista, como eu já
disse e é verdade. Sou um marxista que crê em Deus, segue Cristo, e é
revolucionário por causa do seu Reino.”
Na década de 1960, em meio a regimes militares que
golpeavam a América Latina, o compromisso cristão com a causa do oprimido
ressurgiu rebatizado de Teologia da Libertação. O marxismo serviu de fonte para
compreensão e ação em uma realidade extremamente hostil à maioria da população.
A endemonização conservadora que se escancara em
setores sociais privilegiados sempre que Jesus e Marx se descobrem íntimos é
facilmente entendida por profecias como a de Che Guevara:
“A Revolução na América Latina só acontecerá quando
os comunistas deixarem de ser preconceituosos com a fé dos cristãos; e os
cristãos deixarem de ser proselitistas com os comunistas. Nesse dia, a Revolução
será imbatível.”
Na semana em que multidões de pessoas comovidas do
planeta inteiro se despediram de Fidel Castro, falecido aos 90 anos de idade,
vale recordar o que disse certa vez o comandante da Revolução Cubana:
“Ele (Jesus Cristo) foi
o primeiro comunista. Repartiu o pão, repartiu os peixes e transformou a água
em vinho.”
_______________
Para aprofundamento da temática:
- Fidel e a Religião,
livro de Frei Betto.
- Descalço Sobre a
Terra Vermelha, filme que conta a história de dom Pedro Casaldáliga. No
youtube.
*Thales Emmanuel é militante do Movimento dos/as Trabalhadores/as Rurais Sem Terra (MST) e da Organização Popular (OPA).
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