Por Thales Emmanuel**
- Mãe, por que há sempre muitos soldados em todo lugar que
andamos?
Jesus nasceu e cresceu numa sociedade militarizada,
dominada por um império estrangeiro que impunha ao povo, além de altos
tributos e total obediência, uma estrutura social baseada na concentração da
propriedade privada da terra e de outros meios de produção. Os ricos da
Palestina eram protegidos e, ao mesmo tempo, servidores dos interesses de
Roma. Em nome de César, autodeterminavam-se o direito de barrar
qualquer investimento social para, com o uso da
espada, empobrecer, segregar e escravizar a maioria da
população.
- Mãos na cabeça, galileu vagabundo!
A Galileia, região onde Jesus nasceu e viveu boa parte de
sua vida, era tão marginalizada pela classe dominante como os
morros do Rio de Janeiro. Ainda jovem, Jesus teve que conviver
com frequentes baculejos. Tinha os atributos que os soldados
denominavam “perfil suspeito”. Era preto, pobre, vestia-se com simplicidade e
falava em aramaico, língua do meio popular. Sua casa e as da vizinhança
eram invadidas na madruga sem mandados judiciais. Pessoas arrancadas para
interrogatório sumiam misteriosamente. Quando levaram Amarildo,
habilidoso pedreiro da vila de Nazaré e seu colega de infância, Jesus chorou
lágrimas de sangue no colo de uma mãe preocupada com o
futuro. A chamada Pax Romana, a “paz sem voz”,
período de relativa estabilidade do domínio imperial, se impunha pela
violência contra a classe que produzia a riqueza que os grandes
proprietários usurpavam, acumulavam e usavam para financiar as
ações da repressão. “Aê, Pilatos, para assegurar o sucesso de nossa
política de segurança pública, quero garantias para agir sem que surja uma
nova Comissão da Verdade”, exigiu o interventor Herodes Villas Bôas.
- Mãe, preciso partir!
Quando as Unidades de Polícia Pacificadora de César se
instalaram na Galileia e uma delas decapitou seu primo, João
Batista, só por ele ter falado publicamente umas verdades, Jesus se
indignou tanto, que decidiu sair de casa para se tornar militante na construção
de uma nova sociedade. Uma em que não
houvesse imperadores nem senhores, sem opressão, em que poder fosse
sinônimo de serviço; uma sociedade que batizou com o nome de Reino de
Deus. Enquanto a resistência e luta do povo lhe alimentavam com imprescindíveis exemplos,
os soldados de Roma condenavam como bandidos e
crucificavam todas as pessoas que de alguma forma se contrapunham
às ordens de cima. A Mídia dos Altos Sacerdotes do Templo
de Jerusalém fazia sua parte manipulando as
mentes pela disseminação de ódio contra os que se colocavam a
serviço da causa dos oprimidos. Quarenta dias antes da Páscoa do ano
32, todos os integrantes de um grupo cultural da Galileia, chamado
Paraíso do Tuiuti, foram crucificados por criticarem, em suas
alegorias e canções, a exploração que pesava sobre o povo. “No dia em que
a Galileia descer e não for carnaval, ‘ordem e progresso’ terá outro
sentido afinal/ Não tem órgão oficial nem governo nem liga, nem autoridade
que compre essa briga, ninguém sabe a força desse pessoal/ É só a Galileia
descer sem ser carnaval’”, expressava corajosamente a letra de uma
das canções.
O final dessa história todos nós conhecemos. Com a
ressurreição, Jesus veta aos donos do poder a última
palavra e o projeto do Reino se reinventa à cada época. Sinal de
que essa história é uma história gestando um final.
- Filho, eis-me aqui!
*Publicado originalmente em
Informativo Redentorista.
**Thales Emmanuel é militante da
Organização Popular (OPA) e do Partido Comunista Brasileiro (PCB).
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