sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Os profissionais da imprensa e o interesse público




*Por Pe. Julio Ferreira, C.Ss.R.


Quero iniciar essa temática com uma afirmação de Noblat (2005), quando ele afirma que o público acredita (ou quer acreditar) no que o jornalista diz, porque parte do pressuposto de que ele diz (ou tenta dizer) a verdade. A credibilidade, segundo ele, é o principal bem do jornalista. Na mesma linha de pensamento, Mário Rosa (2008) diz que o jornalista não vende mercadoria e sim confiança. Ele traz em seu bojo a credibilidade.

Para a maioria das pessoas, o que chega em suas casas como realidade, chega através da mídia, seja ela falada ou impressa. Segundo Christofoletti (2008), atualmente, a mídia ocupa lugar central na vida de todos. Ajuda a moldar nosso imaginário, estabelecer prioridades e descartar opções. Por isso, o jornalista tem que ter bem presente, e de maneira consciente, o tamanho da importância do seu papel na sociedade.

Infelizmente, nem todo jornalista, no exercício da profissão, pensa o Jornalismo como criador de democracia e o coloca no viés do sensacionalismo e da mercadoria. O que nasceu para ser "salvaguarda" da sociedade passa de repente a ser temido pela mesma. Há um descompromisso do Jornalismo com a sociedade e seus problemas. O imperativo é vender notícia, a qualquer custo. Para Bucci (2008) já não é aceitável o argumento dos que dizem oferecer aquilo que o povo pede.

Na sociedade do espetáculo, o interesse econômico se sobrepõe aos valores humanos. Segundo Adorno e Horkheimer (apud PATIAS, 2006: 88), na indústria cultural tudo se torna negócio e a pessoa humana ganha um coração máquina. No reino do espetáculo, o ser humano deixa de ser sujeito da sua historia e passa a ser um mero consumidor das produções espetaculares produzidas pela mídia, que, na visão de Patias (2006), subvertem a ordem de importância e veracidade dos fatos.

O cotidiano, a vida real, aparecem nas telas como se fossem uma ficção, mais uma novela. Segundo Bucci (2008), as câmaras invadem barracos e cortiços, e gravam sem pedir licença à estupefação da família de baixíssima renda que não sabe direito o que se passa.

Os jornalistas têm a capacidade de transformar o cotidiano, na visão de Bourdieu (1997), em extra-cotidiano. Para ele, os jornalistas têm “óculos” especiais a partir dos quais vêem certas coisas e não outras [...] O princípio de seleção é a busca do sensacional, do espetacular. Nem sempre o que é de interesse público parece ser interessante aos olhos dos profissionais da Imprensa.


*Missionário Redentorista, Militante da Organização Popular de Aracati - OPA - Jornalista e Assessor das CEBs do Regional NE 1.

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Sobre leis e baratas

Fortaleza, 18 de setembro de 2015.
Por Thales Emmanuel*

O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu ontem a inconstitucionalidade do financiamento empresarial de campanhas eleitorais. A votação foi 8 a 3.
Um dos três, como se era de esperar, foi do conhecido golpista à paisana, Gilmar Mendes. Contrariado com o resultado, tal e qual outros golpistas à paisana com as eleições presidenciais do ano passado, o ministro afirmou que a deliberação é um "convite à prática reiterada de crimes de lavagem de dinheiro".
É... quando são tomadas medidas restritivas à influência das grandes fortunas sobre a política (ou sobre qualquer outra questão de interesse público), vale declarar que ir de acordo com a Constituição Federal é um erro, né!?
Para o senhor Gilmar Mendes, leis que vão de encontro aos interesses do capital significam, na verdade, convites ao capital para infringir a lei. "O STF vem, por meio deste, convidar os senhores capitalistas a seguirem presentes, agora de forma velada, privatizando a política com seus bilhões...", mais ou menos assim.
Para essa ruma de enxofre coberto com toga, melhor seria regulamentar o crime, como foi feito com a modificação do Código Florestal, trazendo a chacina da natureza e de pessoas pelo agronegócio para a cumplicidade da esfera legal. Como se assassinos fossem menos assassinos por constar em lei a liberdade para assassinar. Ou como se "intervenção militar constitucional" fosse menos golpe que sua materialização siamesa de 64.
Agora... difícil mesmo é constatar que a compra de voto também é proibida em lei.
Que ao menos de hoje em diante façam, mas façam sabendo do risco de irem parar no xilindró!
Ah! Ia me esquecendo que cadeia, no capitalismo, é coisa pra pobre.
Foi mal! Deve ter sido a empolgação.
De qualquer forma, vale a vitória e vale também saber que marionetes do capital perdem batalhas e composturas.


*Thales Emmanuel é militante do Movimento dos/as Trabalhadores/as Rurais Sem Terra (MST) e da Organização Popular (OPA).

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Mediterrâneo


Fortaleza, 10 de setembro de 2015.

Por Thales Emmanuel*

A divulgação de imagens mostrando a corrida migratória de milhares de pessoas da África e Oriente Médio para Europa tem chocado muita gente. O ponto culminante para quem acompanha o drama pela TV foi a fotografia do corpo de Aylan Kurdi, menino de 3 anos de idade que morreu fugindo da guerra na Síria ao tentar atravessar, com a família, o Mediterrâneo, na região entre a Turquia e a Grécia.

O mar Mediterrâneo é de longa data importante rota comercial e está, inclusive, diretamente ligado à história de nascimento da sociedade burguesa: o capitalismo, cuja característica principal – e que sem ela não seria capitalismo –, é atrair tudo à sua volta para a engrenagem da mercantilização.

Tudo se torna mercadoria. Fazem-se guerras para conquistar mercados ou para gerá-los. Divulgam-se notícias inventadas com o intuito de invadir países para lhes roubar o petróleo. Forjam-se grupos terroristas para desestabilizar e derrubar governos não alinhados. Segundo a ONU, 85% das notícias que circulam no mundo são geradas nos EUA. Isso acontece para que a realidade seja enxergada através da pupila dos opressores.

E onde se pretende chegar com toda essa arrumação? “O objetivo é colocar um chip em todo mundo. E ter tudo nesses chips. E se alguém quiser protestar sobre o que fazemos e quiser violar o que queremos, então só apagamos seu chip.” (Declaração atribuída a Nicholas Rockefeller, um dos homens mais ricos do mundo, por, à época seu amigo, Aaron Russo, cineasta e político.)[1]

Enquanto isso, no Mediterrâneo, dolosamente, corpos bóiam a deriva, ou seria a espera... de um destino sem códigos de barras que possa  ser traçado por quem segue com vida?

Mas onde fica mesmo o Mediterrâneo?

Aqui, quando mães são forçadas a amamentar seus filhos com leite envenenado pelo agrotóxico utilizado nas grandes fazendas do agronegócio.

Aqui, quando pais sem teto são despejados de suas áreas, migrando de um lado a outro com suas crianças lacrimogeneadas pela repressão do Estado, o mesmo que, por lei, teria o papel de fazer cumprir o direito fundamental à moradia.
Aqui, quando ser jovem preto e pobre vale a pena de morte.

Aqui, quando nos corredores dos hospitais lotados crianças morrem antes de chegar à sala de tratamento. Desinvestimento público para fazer migrar para os cofres dos planos de saúde privados o retorno com juros do dinheiro investido em época de campanha.

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Por que é tão difícil enxergar Aylan Kurdi nos meninos asfixiados pela pólvora das balas do latifúndio atiradas contra o povo Guarani-Kaiowá, em Mato Grosso do Sul?


Afinal de contas, quantos mares nos separam do Mediterrâneo?


*Thales Emmanuel é militante do Movimento dos/as Trabalhadores/as Rurais Sem Terra (MST) e da Organização Popular (OPA).




[1] Ver documentário “Zeitgeist, The Movie”, no youtube.

JOGO DE INTERESSES


Aracati, 04 de setembro de 2015.

*Por Jonesilson Doddy

 
“Bem comum”, ideia que a sociabilidade burguesa trata de esvaziar de forma e de conteúdo. Enquanto interesses individuais e interesses coletivos se digladiam numa luta de morte, a indignante desigualdade social já não indigna tanta gente, torna-se espetáculo, audiência, pânico de chegar também à minha porta.

No campo político, este conflito está nitidamente presente. Os partidos se esquecem do caráter universalizador que deveriam carregar, ainda que alguns só hipocritamente, e pisam a rinha do poder já sem disfarce: “Se eu cair, levarei muita gente comigo.” O adversário antagônico torna-se rapidamente o aliado inseparável, ambos precisam devolver, multiplicado, o que foi entregue por seus financiadores de campanha. As grandes empresas universalizam entre si o direito, quer dizer, o poder de eleger seus governantes.

Tempos de crise. O capitalismo é uma crise! A direita convoca, sai às ruas com gritos antes só ouvidos de gargantas de esquerda. Estratégias para atrair o povo para seu lado. Quer chantagear, provocar sangria, quer derrubar o governo custe o que custar.

E a esquerda? Vai às ruas com seus gritos e bandeiras. Alguns movimentos até defendem o atual governo. “A outra direita é ainda pior”, alegam. O governo se encontra sufocado e sem forças. Chegou ao poder graças aos movimentos e organizações populares, mas não governou com os mesmos. Aliou-se à chantagem, sendo alvo desta. Não percebe que chantagem exitosa é só a premissa para mais chantagem? Tombando pro lado de cá, o governo busca se apoiar nos movimentos, que, por sua vez, ficam sem apoio do governo.

Impossível sobreviver por longa data neste jogo de interesses.

Para os movimentos e organizações populares, nem retrocessos nem falsas alternativas. Caminhar como se pode, com a condição de ser com as próprias pernas.

 

 

*Josenilson Doddy é militante da Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP) e da Organização Popular (OPA).