Por Thales Emmanuel*
No dia 07 de
maio deste ano, em Fortaleza-CE, um acidente no Km 06 da BR 116 gerou grande
comoção social.
Era sábado,
véspera de Dia das Mães. Laís e Raphaella – mãe e filha –, mais Fátima – amiga
e vizinha –, voltavam para casa depois de participarem de uma celebração
religiosa.
Segundo
relatos, mais ou menos no mesmo horário, Abelardo, um jovem de 24 anos, tomava
de assalto uma caminhonete e, na tentativa de fuga, sendo perseguido pela
Polícia Militar, colide violentamente com o veículo que conduzia as três
mulheres, que morrem na hora. Abelardo sobrevive com escoriações no corpo.
Em 2015, Márcia,
designer de interiores, não só frustrou a mídia sensacionalista, que já encampava
a carnificina propagandística pela redução da maioridade penal, como
surpreendeu muita gente ao provocar reflexões na contramão do que somos
induzidos e coagidos a sentir diante de situações como a que precisou enfrentar.
Seu ex-marido, médico, foi morto a facadas quando pedalava na Lagoa Rodrigo de
Freitas, no Rio de Janeiro-RJ. Em meio à tragédia, declarou a mulher: “Ele foi
uma vítima de vítimas”.
A ideologia
dominante não significa somente a reprodução de ideias convenientes a uma
determinada lógica de dominação. Nossos sentimentos, a maneira como afloram nas
mais variadas circunstâncias, são igualmente produtos e, em regra,
sustentáculos de uma mesma normatividade social.
Assim, diante
da dor da perda abrupta, não é difícil entender porque somos levados a
confundir justiça com vingança pessoal, castigo e repressão policial com
segurança.
A ocultação
proposital da raiz do problema não desponta sem o arrebatador entorpecimento
das estratégias propagandísticas, que nos fazem vagar delirantes, na
superficialidade das abordagens.
Para bem, a
história, mesmo a história de uma tragédia, não morre com a morte nem é
encarcerada com a prisão.
Abelardo e sua
família são do interior. Durante algum tempo, foram acampados da Reforma
Agrária. Estiveram em baixo de lona preta, junto com outras famílias, às
margens de uma grande propriedade vazia de produção e de sentido social.
Muito jovem e
praticante de artes marciais, pretendia organizar um espaço e dar aula a quem
quisesse da comunidade, logo que a terra fosse conquistada. Mas o latifúndio se
manteve intacto ante qualquer bom senso em relação à vida daquelas famílias e a
terra seguiu cercada e abandonada, sem ser entregue aos trabalhadores e
trabalhadoras.
Abelardo,
então, foi embora com seus pais, saiu do acampamento. Anos depois reapareceu
nas páginas policiais de jornais de todo país.
Algumas
perguntas são inevitáveis: Qual a responsabilidade do latifúndio e de seus
governos na morte das três mulheres? Onde estariam os Abelardos da vida,
fazendo o que, caso a Reforma Agrária fosse já uma realização e não uma antiga
reivindicação popular?
Em Goiás, dois
militantes do Movimento Sem Terra estão presos, enquadrados na Lei
Antiterrorista, por lutarem pelo direito à terra. A Justiça... quanto sangue
inocente há em suas mãos? Quantas mães morrerão ainda, até que se entenda que a
propriedade não pode estar acima da vida? Até que o Estado, que tem isso como
cláusula pétrea, seja abolido?
Não se trata
aqui de isentar o indivíduo de suas responsabilidades. Antes, porém, de relembrar
que todo problema pessoal é um problema social e todo problema social é um
problema familiar, pessoal. Queiramos ou não.
Dia dos Pais
está chegando. Que sociedade gostaria de receber de presente? Que mundo
pretende deixar para a geração de futuros pais? O que estamos dispostos a
construir? O que fazemos para destruir o que nos destrói?
*Thales
Emmanuel é militante do Movimento dos/as Trabalhadores/as Rurais Sem Terra
(MST) e da Organização Popular (OPA).
É disso que precisamos. De verdadeiras análises, não de superficialidades que a mídia dominante e a elite econômica e política querem nos passar.
ResponderExcluirEncontrar a raiz dos problemas que afligem nossa sociedade é desafio possível, no entanto resolver situações que ajudam a sanar os problemas que esta mesma 'raiz' impõe(Reforma Agrária) nos remete ao trabalho árduo de formiguinhas para de uma vez garantir vida digna.
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