quinta-feira, 23 de março de 2017

Francisco

Por Pe. Julio Ferreira, C.Ss.R*

Logo no início do papado de Francisco, escutei de um padre amigo: "Agora sinto-me validado como padre". No dia 13 de março de 2017, quando se chega aos quatro anos de Francisco como bispo de Roma, sente-se que o sentimento expresso por meu amigo padre é, na verdade, compartilhado pela Igreja dos pobres. Todos nós nos sentimos validados em nossas palavras e ações na defesa da vida. 

Essa validação nos faz lembrar a ressurreição de Jesus. Quando os grandes e poderosos, que mataram Jesus, pensaram ter a última palavra, Deus-pai o ressuscita. Ele valida tudo o que o filho disse e fez. Somos validados, depois de perseguidos (muitas vezes calados pela própria Igreja e pelo "fermento dos fariseus" que se infiltra em nossas CEBs, em nossas lutas, nos movimentos populares etc). 

No dia 13 de dezembro de 2013, Francisco enviou uma mensagem para o 13º Intereclesial das CEBs. Na mensagem, recordou o documento de Aparecida: "As CEBs são um instrumento que permite ao povo chegar a um conhecimento maior da palavra de Deus, ao compromisso social em nome do Evangelho, ao surgimento de novos serviços leigos e à educação da fé dos adultos (DA 178). E conclui a mensagem convidando os participantes do 13º Intereclesial "a vivê-lo como um encontro de fé e de missão, de discípulos missionários que caminham com Jesus, anunciando e testemunhando com os pobres a profecia dos novos céus e da nova terra." Foi a primeira vez na história dos Intereclesiais que um papa nos dirigiu uma mensagem. 

Aos movimentos populares, em um primeiro encontro, no dia 28 de outubro de 2014, Francisco agradeceu por terem aceito o convite para debater os problemas sociais. Disse-lhes: "Vós viveis na vossa pele a desigualdade e a exclusão. Anseios como terra, trabalho e casa deveriam estar ao alcance de todos, mas encontram-se distantes da maioria das pessoas, enfatizou Francisco. "É estranho, mas se falo disto para alguns, o papa é comunista." Ao final do encontro, Francisco exortou que os movimentos populares continuem lutando, pois é um bem que se faz a todos.  

Como não se sentir validado diante de um papa que tem a sensibilidade de reconhecer que a missão da Igreja é curar as feridas do mundo atual? "Quantas feridas gravadas na carne de muitos que já não têm voz, porque o seu grito foi esmorecendo e se apagou por causa da indiferença dos povos ricos." Um papa que tem a coragem de questionar o sistema econômico vigente e dizer que ele não se sustenta mais?

E, por fim, como não  sentir que se está no caminho certo, quando o próprio papa, que nos valida em nossas ações na construção do Reino, é incompreendido? Por que não dizer: perseguido pelos que desejam que a Igreja continue servindo a dois senhores (como se fosse possível)? 

* Missionário Redentorista, militante da OPA e jornalista.




quinta-feira, 16 de março de 2017

15 de Março: manifestações populares “Fora, Temer!” se ampliam.

Por Thales Emmanuel*


Ontem, 15 de março, o Brasil foi tomado por incontáveis manifestações contra o projeto antipopular e pró-capital personificado pelo presidente golpista Michel Temer (PMDB). Para além das capitais, muitos outros municípios realizaram manifestações. Há estimativas que variam entre 600 mil e mais de um milhão de pessoas em todo o país.


Foi o caso de Crateús, cidade de pouco mais de 70 mil habitantes, no interior do Ceará. Sete dias após as mulheres tomarem as ruas e ocuparem o prédio do INSS contra Temer e sua política de retirada de direitos da classe trabalhadora, organizações e entidades tornaram a protestar pelos mesmos motivos, inserindo-se na luta nacional que mobilizou e paralisou vários setores sociais, da polícia civil a metroviários.

O ato se iniciou por volta das 8:40h, com uma marcha pelo centro da cidade. Escolas municipais e a agência local do INSS paralisaram suas atividades em protesto. A aula foi na rua. Indígenas, camponeses/as, professores/as, estudantes, trabalhadoras/es do campo e da cidade aderiram. 


Aproximadamente às 10h, os mais de 300 marchantes ocuparam a prefeitura municipal, sendo liberada somente às 21h, após audiência de negociação de reivindicações com o prefeito Marcelo Machado (do partido Solidariedade) e seu secretariado.

Fábio Pereira, do Movimento dos/as Trabalhadores/as Rurais Sem Terra (MST), falou da perseguição atual sofrida pelos movimentos populares, citando como exemplos os exilados políticos do MST. “Militantes com prisão decretada por simplesmente organizarem a luta pelo direito constitucional à Reforma Agrária. Além da criminalização da luta popular, no campo, outro plano dos golpistas é reprivatizar as terras dos assentamentos. O agronegócio assassina gente, a naturezaadoece os alimentos e agora pretende nos expulsar novamente de nossas terrasSó superaremos este estado de coisas pela nossa união de classe e pela nossa luta. Fora, Temer!” 


A professora Regina Coele, da Universidade Estadual do Ceará (UECE)lembrou a importância da participação das crianças e da juventude no ato: “Estão aqui crianças e jovens do campo e da cidade, e isso é muito importante. Esse presidente que aí se encontra é um golpista, sim! O governo do PT também pecou em sua política de alianças. Não repetiremos esse erro! A esquerda precisa fazer uma autocrítica. 

Enquanto a Rede Globo segue com seu editorial concedendo amplo destaque a pequenos batidos de panela em bairros nobres; no mundo real, as manifestações populares só se ampliam. 
  
*Thales Emmanuel é militante do MST e da Organização Popular (OPA). 

quinta-feira, 9 de março de 2017

8 de Março


Por Thales Emmanuel*
“Mulher bonita é mulher que luta!” O grito que ecoou por mais de 500 vozes femininas – e por que não dizer feministas? – pelas ruas de Crateús-CE, ontem pela manhã, foi grito de protesto, que se somou a outros gritos de outras tantas mulheres organizadas em mobilizações Brasil e mundo à fora.


Por aqui, a marcha, que se iniciou às 8:30h e tomou conta das ruas do centro da cidade, culminou em ocupação da sede do INSS até além das 11h. Aí o “Fora, Temer!” se juntou ao “Lutemos! Lutemos! Nenhum direito a menos!”.
A luta contra as tentativas do governo golpista de Michel Temer de implementar suas reformas antipopulares na previdência foi pauta de todas as organizações que construíram o ato, do campo à cidade. Lá estavam, por exemplo, o Movimento dos/as Trabalhadores/as Rurais Sem Terra (MST), a Frente Social Cristã (FSC) e o Sindicato dos/as Professores/as.


Creonice Bezerra, militante do MST, denunciou: “Esse Temer, golpista, machista, se aposenta com 54 anos e quer que nós só nos aposentemos com 65. Por isso, as mulheres estão ocupando o Brasil em luta.”
Da FSC, Tereza Barros, de 75 anos, acredita que “o movimento golpista é um vírus sobrevivente da ditadura militar iniciada em 1964. São anti-humanos. Mas do outro lado, como na época daquela ditadura, hoje existem pessoas corajosas, pessoas que enfrentam o que for preciso. Acreditam que Deus é libertação.”
Com a ocupação, alguns funcionários e funcionárias da instituição federal, e também clientes em espera de atendimento, colocaram-se favoráveis ao protesto. Foi o caso da assistente social, Daniele Araújo, que, em nome do Conselho Federal do Serviço Social, destacou a campanha do órgão contra a retirada de direitos e as opressões em geral: “’Os manos, as minas e as monas vão parar!’ A luta é dia-a-dia. Essa reforma da previdência não vai passar. Nenhum direito a menos!”

Lia Pinheiro, professora da Faculdade de Educação de Crateús (FAEC), núcleo da Universidade Estadual do Ceará (UECE), declarou que “a luta do movimento de mulheres é internacional e anticapitalista. Contra toda forma de opressão, de racismo e de violência contra as mulheres.”
Pelo visto, deve vingar a sentença proferida no carro de som que acompanhava a marcha:
“Nem Temer nem o machismo terão sossego. Nós, mulheres, estaremos em luta permanente!”  


*Thales Emmanuel é militante do MST e da Organização Popular (OPA).