quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Quando se encontra o ponto de unidade, o Pentecostes acontece!



*Por Pe. Julio Ferreira, C.Ss.R.

Temos acompanhado nos últimos meses, a nível nacional, algumas ações dos poderes legislativo, executivo e judiciário que vão claramente na contramão da história, e ferindo de modo direto a classe trabalhadora, os pobres e marginalizados do país. No início do segundo mandato do governo Dilma, vimos os direitos adquiridos sendo retirados da classe trabalhadora, como aposentadoria, FGTS e seguro desemprego; em agosto assistimos a redução da maioridade penal sendo votada e aprovada pela câmara dos deputados em dois turnos; e mais recentemente a lei antiterrorismo, uma clara criminalização dos movimentos sociais, sendo aprovada pelo senado.

Além dessas ações, muitas outras aconteceram e vêm acontecendo não só no País, mas também nos estados e municípios. Em um seminário realizado pelos movimentos sociais e organizações populares da região do Vale Jaguaribe, constatou-se o quanto as comunidades tradicionais vem sofrendo ao enfrentar a fúria do grande capital, através dos grandes projetos: agro-hidronegócio,  carcinicultura,  eólica e etc. Tudo isso com a conivência do Estado.

E o que fazer diante dessa realidade? Percebe-se o quanto a classe dominante está alinhada na hora de defender seus interesses, enquanto a classe trabalhadora ainda não conseguiu se articular e se desfazer dos seus individualismos. Pra vencer o dragão será necessário um enfretamento coletivo, uma unidade das bandeiras de luta, já que o inimigo nos é comum. Como se costuma cantar nos encontros das Comunidades Eclesiais de Base: "sozinho, isolado, ninguém é capaz..."

Vislumbrei, nesse seminário, o grande Pentecostes narrado pelos atos dos apóstolos, onde reunidos de vários lugares e línguas diferentes, todos começaram a se entender. Quando se encontra o ponto de unidade, o Pentecostes acontece! Acredito que os passos dados só trarão benefícios para as lutas, as organizações, movimentos e as comunidades envolvidas. Se o que conseguimos realizar a nível de região do Vale do Jaguaribe, com a participação dos companheiros do Rio Grande do Norte, acontecesse a nível nacional, ações como as citadas acima jamais teriam sido aprovadas.

*Missionário Redentorista, Militante da Organização Popular de Aracati - OPA - Jornalista e Assessor das CEBs do Regional NE 1.

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Lições de 64

Fortaleza, 02 de novembro de 2015.
Por Thales Emmanuel*

O golpe militar-empresarial ocorrido em 1964 no Brasil geralmente é lembrado pelos ecos dos gritos das torturas, pelas inspiradas produções artísticas advindas de dentro ou do exílio e pelos sons de coturnos que marchavam ladeiras a caça de insurgentes e de suspeitos/as.

O que não pode nunca ser esquecido, no entanto, é bom que realce a memória para o que necessita ser constantemente lembrado.

É preciso recordar a motivação principal para o trágico primeiro de abril: a intolerância e implacabilidade inata dos que comandam a ordem social do capital, intolerante e implacável em sua lógica de funcionamento, em sua vocação para explorar e oprimir.

As Reformas de Base, uma série de medidas estruturais de caráter popular, que enfatizavam a soberania nacional, defendidas pelo então presidente João Goulart como parte fundamental de seu plano de governo, tornaram-se intragáveis para a CIA e seus aliados internos, ao ponto de, em nome da democracia, o imperialismo estadunidense condenar de “subversão pelo voto” governos legitimamente eleitos.

A cada sessão de eletrochoque, portanto, a cada contração muscular involuntária, a terra ficava mais concentrada, a política se tornava mais elitizada, os “ricos ficavam mais ricos às custas dos pobres, cada vez mais pobres”. Nas salas escuras do DOI-CODI, eram as demandas populares que gemiam desfiguradas em paus-de-arara.

Enquanto o editorial do jornal O Globo do dia 2 de abril estampava um “Ressurge a Democracia!”, em crescido itálico e negrito, e começava o parágrafo com um “Vive a nação dias gloriosos”, concluindo o texto pedindo para que “Sejamos dignos de tão grande favor”, as organizações da classe trabalhadora, sob forte repressão, iniciavam suas reflexões sobre os acontecimentos.

Teria ocorrido um isolamento do governo ao não se medir de forma correta a pressão vinda de baixo? Como explicar, então, a massiva unidade no histórico comício de 13 de março, na Central do Brasil? Uma leitura equivocada da correlação de forças, ou mesmo uma crença demasiada na institucionalidade burguesa, teria comprometido a devida preparação para o enfrentamento às iminentes adversidades?

Golpes de Estado, como o que aconteceu no Brasil em 1964, são parte integrante da institucionalidade da sociedade capitalista. Os séculos 20 e 21, para citar só a América Latina, confirmam, sem tergiversações, que as chamadas democracias, quando se abrem ao povo, tornam-se inconvenientes aos donos do poder.

Aliás, muito de golpe acontece sem que rupturas com um certo modus operandi de dominação sejam necessárias. É por isso que, mesmo atualmente, um Projeto de Lei Complementar como o 101/15, de iniciativa do executivo e aprovado no senado, enquadra como ações terroristas manifestações de caráter político e ideológico organizadas por movimentos sociais. Nos bairros operários da periferia e onde a resistência popular oferece outros sérios riscos aos interesses do capital, o Estado de Sítio não se constitui uma política de exceção, mas se institui enquanto regra. Não à toa, boa parte dos símbolos da pátria permanece personagens ligadas à autocracia da intolerância, desde nomes de avenidas à simbologia das forças armadas.

Não é de se admirar que FIESP, Banco Itaú e Rede Globo estejam no topo da pirâmide social há pelo menos 50 anos, como alicerces políticos dos regimes. 

Deve ser isso que torturadores da época, convocados recentemente a depor na Comissão Nacional da Verdade, queriam explicar ao se referir a tal “consciência do dever cumprido”: uma alteração de 21 anos no curso da história para que a história pudesse seguir sem alterações.





*Thales Emmanuel é militante do Movimento dos/as Trabalhadores/as Rurais Sem Terra (MST) e da Organização Popular (OPA).  

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

DNJ em Aracati

Aracati, 26 de outubro de 2015.
Por Josenilson Doddy*

Todos os anos, em outubro, desde 1985, as juventudes celebram o DNJ – Dia Nacional da Juventude. Momento este que foi primeiramente encabeçado pelas pastorais da juventude, as únicas organizadas até então dentro das estruturas eclesiais.
Nas últimas décadas, várias expressões juvenis surgiram e se engajaram na construção deste momento, trazendo os anseios das juventudes com temáticas voltadas para as mesmas e dentro do contexto social. A finalidade é de traçar meios para sanar problemáticas não só da juventude, mas da sociedade como um todo, trazendo para os jovens o protagonismo de tais transformações.
Neste ano o DNJ veio com o tema: Juventude Construindo uma Nova Sociedade. A Diocese de Limoeiro de Norte-CE realizou seu momento na paróquia de Aracati, reunindo mais de 600 jovens. Na programação teve uma análise geral do tema, demonstrando o quanto a participação da juventude é crucial para romper com as estruturas de opressão e desigualdade, assim como fez o Cristo Libertador, que lutou para que todos e todas tivessem vida em plenitude.
Também foram trabalhadas diversas oficinas, com algumas temáticas bem reflexivas e polêmicas, todas de fundamental importância para a juventude.
O Encontro produziu, ao final, uma Carta Compromisso que sintetizou o momento, trazendo desde fortes denúncias contra o machismo, a homofobia e o racismo, bem como a degradação da casa comum pelo modelo de desenvolvimento econômico em curso e a exploração da classe trabalhadora no sistema capitalista. A Carta simboliza a aliança da juventude com o projeto defendido por Jesus de forma atualizada.
O DNJ foi um momento riquíssimo de formação, mas é necessário que a juventude se comprometa realmente com o que foi traçado. Que este DNJ não tenha sido apenas um momento de euforia e de debates, pois é necessário colocar em prática a vivência do evangelho, iluminados pelo Nazareno que foi até as últimas consequências em defesa da vida.
Que assim sejamos nós, jovens comprometidos com as causas dos oprimidos, que sejamos capazes de tremer de indignação a cada injustiça, e que lutemos até as últimas consequências para que haja vida, vida em plenitude, pois nós, jovens, temos o poder de transformar e fazer acontecer as necessárias mudanças sociais.





*Josenilson Doddy é militante da Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP) e da Organização Popular (OPA).




segunda-feira, 19 de outubro de 2015

CARTA ABERTA DIA NACIONAL DA JUVENTUDE – DIOCESE LIMOEIRO DO NORTE



Nós, seiscentos e vinte jovens da Diocese de Limoeiro do Norte-CE, no Dia Nacional da Juventude (DNJ), 18 de outubro de 2015, em Aracati-CE, estivemos reunidos para debater questões que consideramos da maior importância, não só para a juventude, mas para o conjunto da sociedade.
Com o tema central: Juventude Construindo Uma Nova Sociedade, reconhecemos um Jesus lutador, vinculado aos oprimidos e oprimidas, que foi preso político, torturado e executado na cruz a mando dos poderosos de seu tempo. A cruz, cujo significado histórico remonta ao castigo imposto pelo Império Romano aqueles que se colocavam contra a ordem social injusta vigente na palestina de então. Jesus lutou para que todos e todas tivessem vida e vida em plenitude. Esse foi seu crime. Ele agora nos serve de luz, seu exemplo de vida ilumina os caminhos a seguir. 
É preciso cultivar valores na construção dessa nova sociedade que tanto almejamos: o Espírito de Sacrifício nos convoca a nos doarmos por inteiro à causa da justiça e da igualdade; a capacidade de indignação frente as opressões cometidas contra qualquer pessoa em qualquer lugar do mundo nos chama a sentir nas entranhas as dores dos povos e a agir; a rebeldia contra o machismo, contra a homofobia, contra o racismo e todas as formas de exploração e opressão é condição essencial para seguirmos construindo o projeto defendido pelo Nazareno. 
Neste sentido, denunciamos: a exploração capitalista sobre a classe trabalhadora; a ditadura da mídia manipuladora; o latifúndio e a contaminação dos alimentos pelo uso de agrotóxicos; o saque dos cofres públicos para o pagamento da chamada “dívida pública” tantas vezes já paga; a concentração da riqueza nas mãos de poucos e a consequente expansão da miséria; a segregação e extermínio da juventude, sobretudo, a pobre e negra; a degradação ambiental pelos grandes projetos; a criminalização de pessoas, comunidades e movimentos que lutam contra esse sistema de morte; o sequestro da política pelas grandes empresas;o modelo de desenvolvimento que põe o lucro acima da vida. Somos terminantemente contra a redução da maioridade penal. 
Anunciamos um outro mundo possível, pautado na civilização do amor e da afetividade, livre de discriminações. Nos comprometemos a defender a vida onde quer que ela esteja sendo ameaçada, a construir relações de respeito para com o ambiente, pois somos terra, água e ar.
Queremos e nos comprometemos a beber do mesmo cálice que Jesus bebeu e a sermos batizados com o batismo do qual ele foi batizado, pois, para quem quer segui-lo com fidelidade, não há outro caminho. Somos sabedores/as que sozinhos/as não seremos capazes, por isso contamos com o apoio e participação de todos e todas que vislumbram o Reino de Deus já se fazendo entre nós.
   
                                                         “Este sistema é insuportável.              
   (...) Queremos uma mudança, uma mudança real, uma mudança de estruturas.”
                                                                Papa Francisco

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Os profissionais da imprensa e o interesse público




*Por Pe. Julio Ferreira, C.Ss.R.


Quero iniciar essa temática com uma afirmação de Noblat (2005), quando ele afirma que o público acredita (ou quer acreditar) no que o jornalista diz, porque parte do pressuposto de que ele diz (ou tenta dizer) a verdade. A credibilidade, segundo ele, é o principal bem do jornalista. Na mesma linha de pensamento, Mário Rosa (2008) diz que o jornalista não vende mercadoria e sim confiança. Ele traz em seu bojo a credibilidade.

Para a maioria das pessoas, o que chega em suas casas como realidade, chega através da mídia, seja ela falada ou impressa. Segundo Christofoletti (2008), atualmente, a mídia ocupa lugar central na vida de todos. Ajuda a moldar nosso imaginário, estabelecer prioridades e descartar opções. Por isso, o jornalista tem que ter bem presente, e de maneira consciente, o tamanho da importância do seu papel na sociedade.

Infelizmente, nem todo jornalista, no exercício da profissão, pensa o Jornalismo como criador de democracia e o coloca no viés do sensacionalismo e da mercadoria. O que nasceu para ser "salvaguarda" da sociedade passa de repente a ser temido pela mesma. Há um descompromisso do Jornalismo com a sociedade e seus problemas. O imperativo é vender notícia, a qualquer custo. Para Bucci (2008) já não é aceitável o argumento dos que dizem oferecer aquilo que o povo pede.

Na sociedade do espetáculo, o interesse econômico se sobrepõe aos valores humanos. Segundo Adorno e Horkheimer (apud PATIAS, 2006: 88), na indústria cultural tudo se torna negócio e a pessoa humana ganha um coração máquina. No reino do espetáculo, o ser humano deixa de ser sujeito da sua historia e passa a ser um mero consumidor das produções espetaculares produzidas pela mídia, que, na visão de Patias (2006), subvertem a ordem de importância e veracidade dos fatos.

O cotidiano, a vida real, aparecem nas telas como se fossem uma ficção, mais uma novela. Segundo Bucci (2008), as câmaras invadem barracos e cortiços, e gravam sem pedir licença à estupefação da família de baixíssima renda que não sabe direito o que se passa.

Os jornalistas têm a capacidade de transformar o cotidiano, na visão de Bourdieu (1997), em extra-cotidiano. Para ele, os jornalistas têm “óculos” especiais a partir dos quais vêem certas coisas e não outras [...] O princípio de seleção é a busca do sensacional, do espetacular. Nem sempre o que é de interesse público parece ser interessante aos olhos dos profissionais da Imprensa.


*Missionário Redentorista, Militante da Organização Popular de Aracati - OPA - Jornalista e Assessor das CEBs do Regional NE 1.

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Sobre leis e baratas

Fortaleza, 18 de setembro de 2015.
Por Thales Emmanuel*

O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu ontem a inconstitucionalidade do financiamento empresarial de campanhas eleitorais. A votação foi 8 a 3.
Um dos três, como se era de esperar, foi do conhecido golpista à paisana, Gilmar Mendes. Contrariado com o resultado, tal e qual outros golpistas à paisana com as eleições presidenciais do ano passado, o ministro afirmou que a deliberação é um "convite à prática reiterada de crimes de lavagem de dinheiro".
É... quando são tomadas medidas restritivas à influência das grandes fortunas sobre a política (ou sobre qualquer outra questão de interesse público), vale declarar que ir de acordo com a Constituição Federal é um erro, né!?
Para o senhor Gilmar Mendes, leis que vão de encontro aos interesses do capital significam, na verdade, convites ao capital para infringir a lei. "O STF vem, por meio deste, convidar os senhores capitalistas a seguirem presentes, agora de forma velada, privatizando a política com seus bilhões...", mais ou menos assim.
Para essa ruma de enxofre coberto com toga, melhor seria regulamentar o crime, como foi feito com a modificação do Código Florestal, trazendo a chacina da natureza e de pessoas pelo agronegócio para a cumplicidade da esfera legal. Como se assassinos fossem menos assassinos por constar em lei a liberdade para assassinar. Ou como se "intervenção militar constitucional" fosse menos golpe que sua materialização siamesa de 64.
Agora... difícil mesmo é constatar que a compra de voto também é proibida em lei.
Que ao menos de hoje em diante façam, mas façam sabendo do risco de irem parar no xilindró!
Ah! Ia me esquecendo que cadeia, no capitalismo, é coisa pra pobre.
Foi mal! Deve ter sido a empolgação.
De qualquer forma, vale a vitória e vale também saber que marionetes do capital perdem batalhas e composturas.


*Thales Emmanuel é militante do Movimento dos/as Trabalhadores/as Rurais Sem Terra (MST) e da Organização Popular (OPA).