Pulverização aérea de agrotóxico em um imenso deserto verde
**Por Thales Emmanuel
Em 1996, no Pará, 21 camponeses do Movimento dos/as Trabalhadores/as Rurais Sem Terra (MST) foram assassinados pela Polícia Militar quando marchavam em direção à capital, na luta pela Reforma Agrária. Dezenas ficaram para sempre sequelados/as.
17 de abril, data do Massacre de El Dourado dos Carajás, tornou-se Dia Internacional da Luta Camponesa. No Brasil, todo o quarto mês do ano é dedicado a ações de denúncias contra o latifúndio e a cumplicidade do Estado, bem como ao anúncio de um outro projeto para o campo. Essa jornada de lutas é conhecida como Abril Vermelho.
Monumento erguido em memória dos mártires de El Dourado dos Carajás
A concentração da terra no Brasil (atualmente 1% de proprietários controla 50% da área rural) está diretamente ligada ao domínio privado sobre os recursos naturais (grandes empresas como donas das águas subterrâneas, por exemplo), ao inchaço populacional nos centros urbanos e à qualidade dos alimentos (cada brasileiro consome em média 7,3 litros de calda tóxica por ano). É neste indignante cenário que a Bancada Ruralista expressa cada vez mais o retrato de um país estruturado para que a lucrativa satisfação de uns poucos se erga sobre o envenenamento e a marginalização de milhões.
Resultado da junção do latifúndio com a grande indústria, os bancos, a mídia empresarial e o Estado - financiador fiel do projeto -, o agronegócio é o principal rosto do capitalismo no campo brasileiro.
"Agro é tech, agro é pop, agro é tudo." A campanha confeccionada pelo departamento de marketing da Rede Globo demonstra bem o lado e o papel assumido pela poderosa emissora na trama. Dá para entender os eufemismos de Fátima Bernardes ao apresentar a Imperatriz Leopoldinense na Marquês de Sapucaí este ano. O samba-enredo da escola foi um verdadeiro grito de guerra contra os "fazendeiros e seus agrotóxicos".
De 1986 para cá, período da chamada "redemocratização", ocorreram aproximadamente 2000 assassinatos no campo brasileiro envolvendo grandes proprietários rurais, com pouquíssimos processos resultando em condenação. Só do MST, presentemente, são 11 presos e 12 exilados políticos.
A mídia empresarial trata as pessoas e organizações que lutam pela Reforma Agrária como violentas e perturbadoras da "boa ordem", enquanto propagandeia o agronegócio como herói nacional. Não mostra que a Bayer, por exemplo, gigante que fabrica o agrotóxico, produz também o medicamento a ser utilizado no tratamento do câncer - doença causada pelo consumo do alimento envenenado.
Manifestação do MST em Brasília
A criminalização do MST e demais movimentos populares do campo visa impedir que uma proposta alternativa, desvinculada dos interesses das grandes corporações - que promova a repartição da terra, o respeito à biodiversidade e assegure a saúde dos alimentos -, ganhe força irreversível na sociedade.
"A Reforma Agrária, além de uma necessidade política, é uma obrigação moral", lembra papa Francisco, citando o "compêndio da doutrina social da Igreja".
Apoiar o Abril Vermelho é um dever cristão, para dizer o mínimo.
PS.: Este ano, a jornada terá um caráter todo especial, pois se unirá às lutas da classe trabalhadora contra o governo golpista de Michel Temer e seu projeto neoliberal, que amputa direitos do povo em benefício das grandes empresas daqui e de fora.
* Texto publicado originalmente no Informativo Redentorista - Vice-Província de Fortaleza.
**Thales Emmanuel é militante do Movimento dos/as Trabalhadores/as Rurais Sem Terra (MST) e da Organização Popular (OPA).
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Fontes para aprofundamento:
- O veneno está na mesa (I e II), documentário de Silvio Tendler.
- Mataram Irmã Dorothy, documentário de Daniel Junge.
- El Dourado dos Carajás - 10 anos, documentário do Setor de Comunicação do MST.
- Reis do Agronegócio, música de Chico César e Carlos Rennó.
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